Está pensando em realizar atividade física e não sabe como começar? Questiona sobre em qual quantidade ela deve ser feita para proteger sua saúde? Será que você precisa ser avaliado por um cardiologista antes? Não sabe quais são realmente os benefícios da atividade física para o seu corpo e seu coração?
A Dra. Maíra é médica cardiologista e cardio-oncologista, e pode te ajudar com essas e outras dúvidas sobre a relação da atividade física com o coração!
Por que praticar atividade física?
A atividade física regular oferece inúmeros benefícios para a saúde cardiovascular – isso é um fato inquestionável, e foi comprovado em diversos estudos clínicos. A realização de atividade física está associada à redução na ocorrência de infarto, acidente vascular cerebral (AVC) e insuficiência cardíaca. Ainda, existem dados que sugerem que realizar atividade física de forma regular pode reduzir em cerca de 40% a chance de morrer por uma doença cardiovascular.
Isso acontece por diferentes motivos – primeiro, de forma indireta, já que a atividade física ajuda no controle de fatores de risco para doenças cardiovasculares. Ela contribui para a redução da pressão arterial, para a perda de peso e controle da obesidade, para a redução do colesterol, para o melhor controle do diabetes mellitus; segundo, de forma direta, já que realizar atividade física gera adaptações fisiológicas benéficas no coração e na vasculatura, promove efeitos anti-inflamatórios sistêmicos e melhora a função endotelial.
Esses benefícios são vistos tanto em contexto de prevenção – para evitar o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, quanto no contexto de tratamento – em pacientes que já tem doença cardiovascular estabelecida. Ainda, qualquer aumento na atividade física, mesmo que modesto, pode trazer benefícios significativos para a saúde, especialmente para aqueles pacientes que atualmente são menos ativos.
Além dos benefícios para o coração, a atividade física regular oferece uma ampla gama de vantagens para a saúde geral. Ela está associada a uma redução significativa no risco de diversos tipos de câncer, incluindo câncer de bexiga, mama, cólon, útero, esôfago, rim, pulmão e estômago. Além disso, reduz o risco de demência, incluindo a doença de Alzheimer, e melhora a função cognitiva em todas as faixas etárias.
Também desempenha um papel crucial na saúde mental – que ela reduz os sintomas de ansiedade e depressão, melhora a qualidade do sono e a qualidade de vida geral. Para a saúde óssea e muscular, a atividade física melhora a densidade óssea e a função física, reduzindo o risco de quedas e lesões relacionadas a quedas em idosos.
Como a atividade física deve ser realizada?
Visando alcançar os benefícios de proteção cardiovascular descritos, existem metas recomendadas na prática da atividade física.
Características:
Precisamos entender, primeiramente, o que é a intensidade da atividade física, e a diferença entre atividade aeróbica e de fortalecimento muscular.
1. Intensidade da atividade física:
A intensidade da atividade física é frequentemente classificada em leve, moderada ou vigorosa, com base na quantidade de energia gasta durante a atividade, medida em unidades de equivalentes metabólicos de tarefa (METs).
- Atividade de baixa intensidade: Geralmente envolve atividades que gastam entre 1,6 e 2,9 METs. Exemplos incluem caminhar lentamente.
- Atividade de intensidade moderada: Envolve um gasto energético de 3,0 a 5,9 METs. Exemplos típicos são caminhar rapidamente (aproximadamente 4 a 6 km/h), andar de bicicleta a uma velocidade de 8 a 15 km/h, dançar ou nadar de forma recreativa.
- Atividade de alta intensidade: Caracteriza-se por um gasto energético de 6 METs ou mais. Exemplos incluem correr, andar de bicicleta a mais de 16 km/h, jogar tênis individual ou nadar em ritmo acelerado.
A intensidade da atividade física também está relacionada com a frequência cardíaca, ou seja, o número de vezes que o coração bate em um minuto. Durante o esforço, a frequência cardíaca aumenta para fornecer mais oxigênio e nutrientes aos músculos.
A frequência cardíaca normal em repouso é de 60 a 100 batimentos por minuto, mas durante o exercício pode variar de acordo com a intensidade. A frequência cardíaca máxima pode ser calculada de acordo com a idade, sendo 226 – idade para mulheres e 220 – idade para homens. Por exemplo, uma mulher de 30 anos terá uma frequência cardíaca máxima de 196 batimentos por minuto, enquanto um homem da mesma idade terá 190 batimentos por minuto.
A intensidade da atividade física pode ser classificada como leve, moderada ou vigorosa, de acordo com a frequência cardíaca:
- Atividades leves: 50% a 60% da frequência cardíaca máxima
- Atividades moderadas: 60% a 75% da frequência cardíaca máxima
- Atividades de alta intensidade: 75% a 85% da frequência cardíaca máxima
Além disso, a intensidade relativa considera a capacidade cardiorrespiratória individual. Por exemplo, uma atividade que é moderada para uma pessoa jovem e saudável pode ser vigorosa para uma pessoa idosa ou com menor capacidade aeróbica. O “teste da fala” é uma ferramenta prática para avaliar a intensidade: durante atividades moderadas, a pessoa pode falar, mas não cantar; durante atividades vigorosas, a pessoa não consegue falar mais do que algumas palavras sem precisar parar para respirar.
2. Tipos de atividade física:
Exercícios aeróbicos, também conhecidos como exercícios de resistência ou cardiovasculares, envolvem a movimentação rítmica de grandes grupos musculares por períodos prolongados. Esses exercícios aumentam a frequência cardíaca e a respiração, promovendo adaptações fisiológicas que melhoram a capacidade de exercício e a saúde cardiovascular. Exemplos incluem caminhar, correr, andar de bicicleta e nadar.
Exercícios de força, ou treinamento de resistência, focam no aumento da força e resistência muscular. Esses exercícios geralmente envolvem o uso de pesos livres, máquinas de resistência ou o próprio peso corporal para realizar movimentos que exigem força muscular significativa. O treinamento de força é caracterizado por repetições limitadas antes da exaustão, e é projetado para aumentar a massa muscular, a força e a capacidade funcional.
Ambos os tipos de exercício são importantes para a saúde geral e podem ser combinados para maximizar os benefícios, como a melhoria da saúde cardiovascular, a redução do risco de doenças crônicas e o aumento da capacidade funcional.
Recomendações:
– Para adultos, de forma geral, recomenda-se pelo menos 150 a 300 minutos por semana de atividade aeróbica de intensidade moderada, ou 75 a 150 minutos por semana de atividade aeróbica de alta intensidade, ou uma combinação equivalente de ambas. Além disso, atividades de fortalecimento muscular devem ser realizadas em dois ou mais dias por semana.
– Para idosos é recomendado um programa de atividade física multicomponente que inclua treinamento de equilíbrio, além de atividades aeróbicas e de fortalecimento muscular.
– Mulheres grávidas e no pós-parto devem realizar pelo menos 150 minutos de atividade aeróbica de intensidade moderada por semana, a menos que haja contraindicações.
– Para pessoas com diabetes, recomenda-se uma combinação de exercícios aeróbicos e de resistência, com atenção especial para evitar longos períodos de inatividade.
– Após um evento de doença cardiovascular, como um infarto do miocárdio, uma intervenção coronária percutânea (implante de stent nas coronárias, vasos que irrigam o musculo cardíaco) ou uma cirurgia de revascularização miocárdica (popularmente chamada de “ponte safena”), a retomada da atividade física deve ser cuidadosamente planejada e supervisionada.
De acordo com as diretrizes da American Heart Association (AHA) e do American College of Cardiology (ACC), a reabilitação cardíaca é altamente recomendada e pode ser iniciada geralmente 1 a 2 semanas após a alta hospitalar, desde que estejam clinicamente estáveis e em pacientes sem sintomas cardiovasculares relevantes – ou seja, desde que não haja sintomas isquêmicos instáveis (dor no peito), insuficiência cardíaca descontrolada ou arritmias potencialmente fatais.
A atividade física supervisionada é preferida, especialmente em programas de reabilitação cardíaca, pois oferece um ambiente seguro e controlado para o paciente aumentar gradualmente a intensidade do exercício. Portanto, a retomada da atividade física após uma doença cardiovascular deve ser feita de forma gradual e supervisionada, com início precoce de programas de reabilitação cardíaca para maximizar a adesão e os benefícios à saúde.
– Pacientes com câncer podem e devem realizar atividades físicas, salvo contraindicações específicas. A atividade física durante o tratamento do câncer pode trazer múltiplos benefícios, incluindo a melhora da qualidade de vida, redução da fadiga, e potencialmente melhor tolerância e resposta ao tratamento.
É recomendado a incorporação de exercícios aeróbicos e de resistência durante o tratamento do câncer, pois esses tipos de exercícios têm demonstrado melhorar a aptidão cardiorrespiratória e reduzir sintomas como a fadiga. Além disso, a atividade física pode ajudar a gerenciar efeitos colaterais do tratamento, como ansiedade e depressão, e pode ser segura para a maioria dos pacientes, desde que adaptada às suas condições individuais.
Estudos indicam que a atividade física pode aumentar a sobrevida livre de doença e reduzir a mortalidade em alguns tipos de câncer, como câncer de intestino e mama. Além disso, a atividade física pode ter um efeito analgésico, reduzindo a intensidade da dor em sobreviventes de câncer.
No entanto, é crucial que os pacientes recebam uma avaliação médica antes de iniciar um programa de exercícios, para garantir que o plano de atividade física seja seguro e eficaz, levando em consideração comorbidades, toxicidades do tratamento e o nível de condicionamento físico do paciente. A supervisão por profissionais de saúde especializados pode ser necessária para alguns pacientes, especialmente aqueles com condições mais complexas.
Contraindicações:
As contraindicações para a prática de atividade física incluem condições severas, potencialmente fatais e instáveis, como angina instável, arritmias cardíacas de alto grau, insuficiência cardíaca descompensada, doença tromboembólica ativa, infecção aguda, diabetes descontrolada, câncer em estágio terminal e problemas psicológicos instáveis.
Em pacientes com doenças cardiovasculares genéticas, atividades que envolvem esforço intenso ou estresse adrenérgico, como natação em pacientes com Síndrome do QT Longo (LQTS) ou atividades que aumentam a temperatura corporal em pacientes com Síndrome de Brugada, também são contraindicadas.
Para pacientes com diabetes tipo 2, a atividade física deve ser evitada se a glicemia estiver acima de 250 mg/dL com níveis moderados ou altos de cetonas no sangue ou na urina, ou acima de 300 mg/dL sem cetonas excessivas. Além disso, complicações como neuropatia autonômica, neuropatia periférica, retinopatia diabética e doença renal diabética requerem precauções específicas durante a atividade física, para evitar machucados e lesões.
Durante a gravidez, condições como doença cardiorrespiratória severa, descolamento prematuro de placenta, vasa prévia, diabetes tipo 1 descontrolada, restrição de crescimento intrauterino, trabalho de parto prematuro ativo, pré-eclâmpsia severa e insuficiência cervical são consideradas contraindicações absolutas para o exercício.
A hipertensão mal controlada pode ser uma contraindicação relativa para a prática de atividade física, dependendo da gravidade e do controle da condição. O exercício físico é amplamente recomendado como parte do manejo da hipertensão, pois pode ajudar a reduzir a pressão arterial de forma eficaz. No entanto, para indivíduos com hipertensão não controlada, especialmente aqueles com pressão arterial sistólica em repouso acima de 200 mm Hg ou pressão diastólica acima de 115 mm Hg, é recomendado adiar o teste de exercício até que a pressão arterial esteja melhor controlada.
Portanto, a avaliação cuidadosa das condições clínicas do paciente é essencial para determinar a segurança da prática de atividade física.
Atividade física de alto impacto x saúde cardiovascular
A literatura médica sugere que doses muito elevadas de exercício podem ter efeitos adversos no sistema cardiovascular. Embora a atividade física moderada a vigorosa reduza a mortalidade e o risco de doenças cardiovasculares, volumes extremos de exercício podem estar associados a adaptações cardíacas potencialmente prejudiciais, como calcificação acelerada das artérias coronárias, liberação de biomarcadores cardíacos induzida pelo exercício, fibrose miocárdica e arritmias cardíacas como fibrilação atrial.
A relação entre a atividade física e a saúde cardiovascular frequentemente segue uma curva em forma de U ou J invertido, onde tanto a inatividade quanto o exercício em excesso podem aumentar o risco de eventos cardiovasculares. Portanto, enquanto a atividade física regular é amplamente benéfica, é importante que os indivíduos, especialmente aqueles que não estão em forma, aumentem gradualmente a intensidade e a duração do exercício para evitar riscos agudos, como morte súbita cardíaca e infarto do miocárdio.
Assim, a atividade física de alta intensidade deve ser praticada com cautela, especialmente em volumes muito elevados, para maximizar os benefícios cardiovasculares e minimizar os riscos potenciais.
Avaliação cardiovascular antes da atividade física
Algumas academias e escolas de esportes exigem que o aluno leve um atestado médico de aptidão física, antes do início das atividades físicas. Isso é necessário?
A avaliação cardiovascular antes de iniciar atividade física não é recomendada de forma universal para toda a população geral. A necessidade de uma avaliação médica formal depende de vários fatores, incluindo a intensidade do exercício a ser realizado, a idade e o status de risco cardiovascular do indivíduo, bem como a presença ou ausência de doença cardiovascular estabelecida.
É recomendado a classificação de risco para agrupar as pessoas em categorias de baixo, moderado ou alto risco com base na presença ou ausência de fatores de risco, sinais ou sintomas, e/ou doenças cardiovasculares, pulmonares, renais ou metabólicas conhecidas. A ênfase é identificar aqueles com doenças conhecidas, pois eles estão em maior risco de eventos cardíacos relacionados ao exercício.
Para adultos saudáveis que desejam iniciar um programa de exercícios de intensidade baixa a moderada, como caminhar, geralmente não é necessária uma triagem médica formal. A exigência de uma avaliação médica e um teste de esforço antes de iniciar exercícios de intensidade moderada na população geral e saudável de adultos não se mostrou útil e pode servir como uma barreira e um atraso para a prática de exercícios físicos, que beneficiaria essa população.
No entanto, para indivíduos que planejam realizar atividades físicas mais vigorosas, especialmente aqueles com fatores de risco cardiovascular ou sintomas sugestivos de doença cardiovascular, uma triagem médica pode ser importante. Isso é particularmente relevante para homens com 45 anos ou mais e mulheres com 55 anos ou mais, ou para aqueles com dois ou mais fatores de risco principais para doenças cardiovasculares – como hipertensão, tabagismo, obesidade, diabetes mellitus, dislipidemia ou história familiar de doenças cardíacas.
Essa avaliação médica pode incluir exame físico detalhado, avaliação de sinais vitais, realização de eletrocardiograma, realização de exames laboratoriais para identificar dislipidemia, anemia, diabetes mellitus. Isso vai ajudar a identificar perfis de alto risco cardiovascular, o que pode justificar exames adicionais, como o ecocardiograma, teste ergométrico ou ergoespirometria.
Para pacientes já com doença cardiovascular estabelecida, é geralmente recomendado um teste de esforço limitado por sintomas antes de iniciar um programa de exercícios – o teste ergométrico ou, em alguns casos, a ergoespirometria. Este teste ajuda a estabelecer um nível de aptidão física de base, determinar a frequência cardíaca máxima e avaliar a segurança do exercício, observando sintomas e sinais eletrocardiográficos de isquemia ou arritmia que poderiam contraindicar o treinamento.
Além disso, para sobreviventes de acidente vascular cerebral (AVC), é recomendado um teste de exercício graduado com monitoramento de eletrocardiograma como parte da avaliação médica antes de iniciar um programa de exercícios. Isso é importante para minimizar os riscos potenciais de eventos adversos durante o exercício, especialmente considerando que muitos sobreviventes de AVC têm doenças cardíacas coexistentes.
Indivíduos que se envolvem em atividades físicas de alta intensidade ou competitivas podem se beneficiar de avaliações cardiovasculares periódicas, especialmente se apresentarem fatores de risco cardiovascular, histórico de doença cardiovascular ou se estiverem em uma faixa etária ou classificação de risco cardíaco que indique um risco maior de eventos adversos relacionados ao exercício. A avaliação cardiovascular de atletas de meia-idade envolvidos em esportes de alta intensidade pode identificar novas anormalidades cardiovasculares em cerca de 3% dos participantes, com alguns sendo excluídos de atividades de alta intensidade devido a descobertas significativas.
Portanto, a recomendação atual é que a triagem cardiovascular antes de iniciar a atividade física deve ser individualizada, levando em consideração a intensidade do exercício planejado e o perfil de risco do indivíduo. Para a maioria dos adultos saudáveis que planejam atividades de intensidade baixa a moderada, a triagem médica formal não é necessária, enquanto aqueles com maior risco ou que planejam atividades mais vigorosas podem se beneficiar de uma avaliação médica prévia.
Pratique sua atividade física com mais segurança! Agende uma avaliação com a Dra. Maíra!
Saiba mais:
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/23877260
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/30558473
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37120119
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https://dramairaibrahim.com.br/quando-procurar-um-cardiologista